Diário da Região
Conjuntura

O que justifica este aumento?

Apesar de todos os direitos garantidos pela Constituição de 1988, o que se vê na prática é um Sistema Único de Saúde (SUS) sucateado

por Hipólito Martins Filho
Publicado em 21/07/2025 às 18:57Atualizado em 21/07/2025 às 22:05
Hipólito Martins Filho (Hipólito Martins Filho)
Hipólito Martins Filho (Hipólito Martins Filho)
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A questão da saúde pública nunca foi levada a sério neste país. Ela não é vista como uma pauta social prioritária — e deveria ser, pois uma população sem os cuidados necessários, além de não ter qualidade de vida e ser pouco produtiva, impacta diretamente nas contas públicas.

 Apesar de todos os direitos garantidos pela Constituição de 1988 — que estabelece a saúde como dever do Estado e direi to do cidadão —, o que se vê na prática é um Sistema Único de Saúde (SUS) sucateado, ainda que fundamental para milhões de brasileiros.

O sistema é subfinanciado. Faltam profissionais da saúde e da área administrativa, medicamentos, infraestrutura, entre outros recursos. Se parece exagero, basta visitar uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e tentar ser atendido em situação de urgência para tirar suas próprias conclusões.

O SUS tem papel relevante especialmente na vacinação, transplantes e fornecimento de medicamentos de alto custo. E não se deve culpar os trabalhadores do sistema: o problema não é falta de vontade ou qualificação, mas de estrutura e recursos adequados.

Para complicar ainda mais o cenário, um estudo do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) mostra que os preços dos planos de saúde no Brasil aumentaram 327% em 18 anos — quase o dobro da inflação no mesmo período. É um crescimento exorbitante, desproporcional, e tende a excluir cada vez mais pessoas da saúde suplementar, pressionando ainda mais o já combalido sistema público de saúde.

Segundo o estudo, se em 2006 você fosse ao supermercado com R$ 100, hoje precisaria de R$ 270 para comprar os mesmos itens — isso é inflação. Agora, se naquele mesmo ano seu plano de saúde custasse R$ 100, hoje ele estaria em torno de R$ 427. Ou seja, enquanto a inflação geral acumulada foi de 170%, o aumento dos planos atingiu 327%. O que justifica essa diferença tão brutal?

Vamos aos argumentos das operadoras: antes, é importante lembrar que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, é o índice oficial da inflação brasileira. Ele acompanha a variação nos custos de bens e serviços essenciais, como saúde, habitação e alimentação.

Segundo o IEPS, os reajustes nos planos de saúde decorrem de fatores como: incorporação de novas tecnologias, reajustes autorizados pelos órgãos reguladores e ineficiências regulatórias. Soma-se a isso o envelhecimento acelerado da população, o que naturalmente implica mais consultas, exames, internações e tratamentos de longo prazo.

Porém, é importante lembrar que o número de nascimentos está em queda, e a população brasileira tende a diminuir — o que, no médio prazo, alivia a pressão sobre o sistema.

É verdade que os custos médicos crescem acima da inflação média, mas isso não justifica um reajuste tão descolado da realidade econômica. A ineficiência regulatória é antiga — por que ainda não foi resolvida?

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) alega que problemas como o aumento constante das coberturas obrigatórias e a judicialização de demandas também contribuíram para os aumentos. Mas essas alegações não explicam reajustes tão expressivos.

É fato que planos de saúde também ficaram mais caros em outros países, como Alemanha, França e Estados Unidos. Mas nenhum deles registrou aumentos na mesma proporção verificada no Brasil.

Outros serviços de saúde também encareceram, mas num ritmo menor. Como exemplo, os atendimentos médicos e odontológicos acumularam alta de pouco mais de 200% no período.

Cabe à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e aos órgãos de defesa do consumidor fiscalizar, explicar e encontrar soluções para esses problemas. E cabe ao consumidor buscar seus direitos sempre que necessário.