Grupo oferecia R$ 50 por sangue de gatos de rua no interior de São Paulo
Segundo a polícia, material era coletado com os animais dopados em Monte Alto e vendido para clínica; três pessoas da região de Rio Preto foram detidas

Gatos de rua estavam sendo usados para coleta e venda clandestina de sangue, em Monte Alto, no interior de São Paulo. O material era vendido para uma clínica veterinária e seria usado para transfusão de sangue em outros pets.
Na casa onde era feita a extração do sangue, guardas municipais encontraram seis gatos desacordados, na noite de sábado, 4. Cinco pessoas, sendo três delas da região de Rio Preto, foram detidas. Após depoimento, três foram presas - mas duas foram liberadas após audiência de custódia. A reportagem busca contato com a defesa dos suspeitos.
A ação da Guarda Municipal aconteceu depois que uma denúncia apontou anúncios em rede social oferecendo pagamento de R$ 50 por gato encaminhado para coleta de sangue. "Oi, meus queridos irmãos e irmãs. Vocês que têm gatos, tem alguém que paga para tirar sangue de gato. Para cada gato, ela está pagando R$ 50. Vocês estão interessados de ganhar dinheiro só me avisar", diz o texto, segundo o registro policial.
Os guardas municipais foram até o endereço, no bairro Monte Belo, acompanhados de uma veterinária do município, e encontraram três pessoas paramentadas com luvas e trajes veterinários, além da proprietária da residência e outra mulher, que seria o contato de uma clínica veterinária de São José do Rio Preto. No local foi constatado que eles estavam coletando sangue dos gatos.
Segundo a veterinária Ana Paula Zilli, diretora de Meio Ambiente do município, que acompanhou a ação, trata-se de "uma ação irregular, numa situação insalubre. Tudo indica que os gatos eram anestesiados com uma dose altíssima de medicamento, sem levar em conta o peso deles. Não tinha balança, equipamentos, nem um veterinário responsável no local. Não tinha nada", diz.
Uma das gatas despertou e tentou escapar, mas a veterinária conseguiu contê-la, pois o animal estava desorientado e abatido. "A gatinha estava cianótica, hipotensa, hipotérmica e eu tive que correr com ela", disse. Ao ser indagado, um dos presentes declarou ser estudante de veterinária, enquanto os outros dois se identificaram como "auxiliares", relatando o envio desse sangue a uma clínica.
Os valores pagos por procedimento seriam de R$ 300 para o estudante e R$ 100 para os auxiliares. A proprietária do imóvel informou que apenas havia cedido o local "para ajudar os animais", e a intermediadora da postagem declarou "não saber que se tratava de uma prática irregular", segundo o registro policial.
O estudante de veterinária, a proprietária da casa e a responsável pela intermediação com a suposta clínica foram presos. Os três passaram por audiência de custódia e apenas o estudante de veterinária foi mantido na prisão. Como o local era clandestino, os frascos de sangue e os equipamentos foram recolhidos e vão passar por perícia.
Imunodeficiência felina
Conforme a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente de Monte Alto, dentre os três gatos recolhidos que já foram tratados e testados, uma fêmea testou positivo para a Imunodeficiência Felina (FIV) - "o que reflete a falta de critérios e os riscos envolvidos nos procedimentos que foram interrompidos em Monte Alto", diz. Os demais ainda farão outros exames. Mais três felinos, tratados pela proprietária da casa, estão sendo procurados para testes.
A imunodeficiência felina é causada por um vírus semelhante ao HIV humano. A FIV não é transmissível a humanos e animais de outras espécies - porém, pode ser transmitida a outros gatos, pela saliva ou sangue. A doença viral ataca o sistema imunológico de gatos, tornando-os mais vulneráveis a infecções e outras doenças secundárias. Não tem cura, mas com acompanhamento veterinário, boa nutrição e manejo adequado, gatos com FIV podem viver uma vida saudável, mas é preciso evitar que entrem em contato com gatos sem a doença.
Conforme a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), um homem de 35 anos e duas mulheres, de 42 e 50 anos, foram detidos no local. O caso foi registrado como abuso a animais e as circunstâncias são investigadas pela Polícia Civil.
A comercialização de sangue humano no Brasil é proibida por lei desde 1988, mas a legislação não trata da prática envolvendo animais. Conforme a Polícia Civil, apenas centros médico-veterinários podem realizar o procedimento, respeitando as normas sanitárias e um código de ética.
A reportagem entrou em contato com o Conselho Regional de Medicina Veterinária do estado de São Paulo e até o momento do fechamento dessa matéria, não obteve retorno.