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A suprema exposição

O ministro do STF Alexandre de Moraes foi a autoridade brasileira mais mencionada nas redes sociais, segundo levantamento da consultoria Arquimedes

por Henry Atique
Publicado em 01/08/2025 às 22:16Atualizado em 02/08/2025 às 01:20
Henry Atique (Henry Atique)
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O Brasil vive tempos de crises múltiplas. Política, econômica, social e, especialmente, institucional. Em meio a esse cenário conturbado, um dado se destaca: em julho de 2025, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, foi a autoridade brasileira mais mencionada nas redes sociais, segundo levantamento da consultoria Arquimedes.

Foram mais de 4,2 milhões de postagens, superando até mesmo temas explosivos como o tarifaço do presidente Donald Trump contra o Brasil. Isso, por si só, é um sinal de grave disfuncionalidade.

Ministros de Supremas Cortes não devem ser protagonistas políticos. A função exige reserva, discrição e compromisso com a técnica jurídica. O protagonismo de Alexandre de Moraes, no entanto, ultrapassou todos os limites habituais da magistratura. Desde que assumiu a relatoria do inquérito das fake news, em 2019, ele se tornou o rosto mais visível do STF, centralizando investigações, decisões cautelares e ordens diretas contra figuras públicas, parlamentares, empresários, jornalistas e plataformas digitais.

O que está em jogo é o lugar do Supremo Tribunal Federal no equilíbrio entre os Poderes. Quando um único magistrado concentra tanto poder, tanta visibilidade e tamanha influência sobre os rumos do país, a balança democrática se desequilibra e o sistema passa a girar em torno de vontades, e não de normas.

Esse hiperprotagonismo institucional não surgiu por acaso. É produto de uma série de omissões e permissividades: o Congresso se absteve de legislar sobre temas delicados, o Executivo se omitiu em defender as instituições de maneira construtiva, e o próprio STF abdicou de impor freios internos. Como resultado, Alexandre de Moraes acabou se tornando não apenas juiz, mas ator político central, com alcance inédito para um ministro da Suprema Corte.

O que agrava esse quadro é o impacto internacional que ele começa a provocar, com destaque para a aplicação pelo governo dos Estados Unidos de sanções ao ministro com base na Lei Magnitsky, instrumento destinado a punir autoridades estrangeiras acusadas de violar direitos humanos ou abusar do poder estatal. Na prática, Moraes foi tratado pela maior potência do mundo como um agente de repressão política. Independentemente das simpatias ou antipatias em torno do presidente americano, a mensagem diplomática é contundente e inédita na história do Brasil democrático.

Nesse contexto se insere também o tarifaço de Trump aplicado contra produtos brasileiros em retaliação não apenas a práticas comerciais, mas também como sinal de desconfiança política. A política externa americana passou a enxergar no Brasil de hoje não uma democracia estável, mas um país em que instituições essenciais, como o Judiciário, cruzaram a linha da neutralidade.

Não é normal que um ministro do STF seja mais comentado que o presidente da República, que vire personagem de memes e alvo de ódio. Isso compromete a credibilidade da Corte e contamina a percepção pública sobre a Justiça. Ao se tornar figura central do debate político, Alexandre de Moraes arrasta consigo a imagem do STF e do Brasil para um campo de instabilidade.

O Judiciário como protagonista permanente do noticiário revela que a democracia está fora de eixo. O STF é indispensável para a guarda da Constituição, mas sua legitimidade é limitada. Quando um ministro vira o epicentro de uma grave crise institucional e internacional, está demonstrado que há algo estruturalmente muito errado no funcionamento do país, inclusive na atuação do Congresso Nacional e do Presidente da República.

Henry Atique

Advogado, professor, ex-presidente da OAB Rio Preto e conselheiro estadual da OAB/SP.