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ARTIGO

A Virgem que não tem sombra

Celebramos não só uma data, mas um mistério que moldou nossa espiritualidade nacional

por ​​​​​​Gilson Ribeiro .
Publicado em 06/12/2025 às 15:25Atualizado em 06/12/2025 às 18:46
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Há histórias que não nascem apenas da fé, mas da sensibilidade humana, entre elas, talvez nenhuma seja tão poética quanto a usada pelos jesuítas aos povos indígenas, ainda no Brasil colonial, ao falar de Maria — A mulher que não tinha sombra. Afinal, era a única criatura em quem o mal jamais ousou tocar — Imaculada Conceição. Esse ensinamento atravessou séculos até se tornar parte do imaginário mariano brasileiro, preparando o coração do povo para o encontro com outra manifestação da mesma Mãe, a Aparecida.

A Igreja ensina que Maria é a mulher totalmente iluminada pela presença de Deus; é a “terra virgem” que recebe a semente divina, por isso, em muitos textos antigos, ela é descrita como pura, e sem mancha, a plenamente luminosa — aquela cuja existência é tão inundada pela luz divina que não projeta sombra alguma.

Aparecida não é um título isolado, seu nome completo é Nossa Senhora da Conceição Aparecida, ou seja, Aparecida é a Conceição — a Imaculada — que apareceu no coração do Brasil, e, teologicamente, são a mesma pessoa celebrada sob dois momentos diferentes uma sendo o dogma universal da pureza original de Maria e a outra a manifestação amorosa para o povo brasileiro.

Quando os pescadores do Paraíba encontraram aquela imagem de barro, com o corpo separado da cabeça, encontraram uma imagem colonial da Imaculada Conceição, de traços delicados, postura típica da tradição portuguesa, uma Imaculada que, por providência divina, reapareceria para acender a fé de uma nação inteira.

É belo notar o contraste da Imaculada a mulher sem sombra, e Aparecida é encontrada no fundo escuro de um rio, coberta de lama, mas ninguém se engane, afinal, a lama não a manchou, quando lavaram a imagem, a luz reapareceu intacta — como se dissesse ao Brasil que a pureza de Deus não se corrompe nem mesmo na água turva das dificuldades humanas.

Portugal proclamou a Imaculada como Rainha do Reino no século XVII, e o Brasil, herdeiro dessa fé, consagrou Aparecida como Rainha e Padroeira da Nação; duas coroações, dois continentes e um único coração materno.

Neste 8 de dezembro, dia dedicado à Imaculada Conceição, celebramos não apenas uma data religiosa, mas um mistério que moldou nossa espiritualidade nacional. A Imaculada é a Mãe da luz, e Aparecida é a luz que se faz próxima, a luz que desce ao rio com o povo e encontra pobres e esquecidos.

Ambas, sem sombra, nos lembram que, quando deixamos Cristo iluminar tudo em nós, até nossas trevas mais profundas se tornam manhã. Acaso não sabeis, eu sou da Imaculada, Totus Tuus, Maria.​​​

Gilson Ribeiro

Contador, cronista, poeta e membro da Academia Maçônica de Letras e Cultura do Noroeste Paulista.