Brasil nunca mais
Durante anos, o que se praticava nos porões da ditadura se tornou inaceitável nos pós-regime

Espionagem paralela feita dentro da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) durante o governo Bolsonaro levantou informações de 152 bispos brasileiros da igreja católica. A ordem para a operação criminosa utilizando o aparato do estado com objetivo de perseguir e chantagear vozes dissonantes foi disparada após carta assinada pelos religiosos criticando o governo Bolsonaro: "o sistema do atual governo não coloca no centro a pessoa humana e o bem de todos, mas a defesa intransigente dos interesses de uma 'economia que mata', centrada no mercado e no lucro a qualquer preço", afirmava o documento.
Alguém pode se perguntar se Bolsonaro pretendia mesmo atentar contra os dirigentes da CNBB, organização católica mais importante da igreja no Brasil, onde repousam seus principais líderes e intelectuais.
Para quem tem dúvida se isso de fato interessava ao presidente e a todos aqueles que planejaram o golpe de Estado no dia 8 de janeiro de 2023, indico que leiam o livro Brasil Nunca Mais, organizado pelo arcebispo Dom Paulo Evaristo Arns e o reverendo Jaime Wright, que traz um relato devastador sobre a ditadura militar brasileira. Um passeio pelo mais abissal sofrimento humano, uma visita ao corredor da morte e à antessala do inferno na terra, onde toda dignidade e resistência física, intelectual e moral sucumbem ao afogamento e ao choque elétrico.
Durante anos, o que se praticava nos porões da ditadura se tornou inaceitável nos pós-regime e na redemocratização, mas, como as viúvas e viúvos do fascismo estão sempre no cio, essa gente perversa e criminosa se aproveitou dos ventos reacionários de 2013 e emergiu dos bueiros amaldiçoados, aterrorizando a sociedade com uma prática permanente de mentiras, violência e apagamento de tudo o que se move e não é espelho.
Sim, Jair Bolsonaro e seu bando precisavam de informações que pudessem servir como instrumento de chantagem contra uma fortíssima instituição que jamais compactuaria ou se silenciaria diante de seu objetivo de perpetuação no poder, fascistização do Brasil e ruptura com o Estado Democrático de Direito.
Eles querem voltar para cena do crime para concluir o que o histriônico e caricato vereador Capitão Jair já dizia em tom de escárnio, em 1999, em programa de TV: a ditadura tem que voltar para matar uns 30 mil. E nós conhecemos o perfil de seus alvos: negras e negros, mulheres, população LGBT e, especialmente, jovens pobres e periféricos.
Espero que esse lamentável episódio sirva de referência crítica aos católicos que ainda não perceberam que a Igreja de Pedro também é um alvo do fascismo.
João Paulo Rillo
Vereador (PSOL)