Diário da Região
ARTIGO

Liberato Caboclo

Liberato era culto e humanista radical, quando falava não devia nada às lideranças de seu partido

por João Paulo Rillo
Publicado em 17/06/2025 às 19:10Atualizado há 23 horas
João Paulo Rillo (Divulgação)
João Paulo Rillo (Divulgação)
Ouvir matéria

Em 1992, com 15 anos, eu participava das passeatas pela cassação de Fernando Collor. Havia clamor popular e o país inteiro se mobilizou pelo impeachment do ex-presidente. Era véspera de eleições municipais e Liberato Caboclo, então deputado federal, era um forte candidato a prefeito em Rio Preto.

Esperava-se que Liberato fizesse uma fala forte e eleitoreira em nome do povo de Rio Preto ao votar pelo impeachment de Collor. Mas não, Liberato fez uma fala serena e cumpriu seu papel votando a favor da cassação de um político corrupto e nocivo aos interesses nacionais.

Para quem o apoiava foi um banho de água fria e para mim também. Mas tive a minha primeira aula sobre ética. Liberato agiu corretamente, não fez demagogia, não se aproveitou de um espaço que seu adversário não teria e, além disso, não era um momento de alegria para o Brasil. Ele perdeu a eleição de 92 para Manoel Antunes. Passei a admirá-lo desde então e, já no movimento estudantil, nos encontrávamos nas manifestações políticas. A retórica do então brizolista, formado no PCB, me impressionava. Liberato era culto e humanista radical, quando falava não devia nada às grandes lideranças de seu partido, como Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, provando que o PCB foi a maior escola de formação política desse país.

Quatro anos depois, Liberato Caboclo foi eleito prefeito em uma composição ultrapragmática, sem seus antigos companheiros de esquerda. Fez uma gestão complexa, com grandiosas pretensões sociais, mas com imensas dificuldades políticas e administrativas, que o levou a enfrentar um processo de cassação na Câmara Municipal.

Eu era 1º suplente de vereador do PT, tinha 21 anos, e, com o afastamento de Cacau Lopes, fui convocado para assumir o mandato. Era uma orientação partidária votar pela Comissão Processante. Eu votei, mas deixei registrado que enxergava erros administrativos sérios e má fé de alguns secretários, mas jamais desvio de conduta ética e moral do ex-prefeito.

Quase 25 anos depois, um ex-prefeito e deputado federal viveu a mesma situação que Liberato Caboclo, mas com uma diferença abissal entre a história e o caráter dos presidentes em julgamento. Dilma Rousseff não praticou corrupção, não cometeu nenhum ato de improbidade e foi vítima de um golpe institucional misógino e violento.

Ex-ministro da própria Dilma, o então deputado e pré-candidato a prefeito em Rio Preto aproveitou os holofotes e fez uma fala covarde e oportunista contra a presidente para “atender” ao clamor popular. Os que achavam que se perpetuariam no poder apenas cumpriram o papel de “inocentes úteis” para a chegada da extrema direita. A história é teimosa!

Se fosse um ator político deste momento bizarro da nossa história, Liberato Caboclo jamais votaria pela cassação de uma mulher íntegra e honesta como Dilma.

Dois fatos históricos que nos revelam que a astúcia pequena e o oportunismo de ocasião nada tem a ver com os grandes propósitos que devem guiar o fazer político.

João Paulo Rillo

Vereador (PSOL)