O futuro e o trabalho
Em linhas gerais, todos os pesquisadores que se dedicaram aos estudos derivados de Marx e de Schumpeter entendem que as inovações não se traduzem, somente, na eliminação de empregos

O final do ano é sempre um momento oportuno para avaliações e planejamento. Empresas, instituições públicas e privadas começam a verificar se as metas e objetivos definidos para o ano foram atingidos ou, se será preciso transferir para o ano seguinte aquilo que não foi realizado. Essa “mecânica”, que pode levar as organizações ao êxito ou a frustração, é semelhante àquela que os indivíduos utilizam. Talvez, faça parte da natureza humana desafiar o futuro ao planejá-lo. Usá-lo como uma espécie de motivação, seja para festejar as conquistas, seja para servir como desculpa para as frustrações. Como cantou Cazuza, algumas pessoas dirão “eu vejo o futuro repetir o passado”, enquanto outras profetizarão “eu vejo um museu de grandes novidades”.
Particularmente, sendo professor e tendo como missão de vida a de preparar cidadãos para o futuro, prefiro a segunda frase do verso da canção. Prefiro ver e fazer com que os alunos vejam o futuro com boas expectativas, apesar das adversidades. E, especialmente, com a esperança de que aquilo que será uma novidade, deverá ser algo melhor do que aquilo que é ou está se tornando passado.
É, também, nessa época do ano que os “quase egressos” do ensino médio começam a se preparar para escolher a carreira profissional que irão seguir, ou seja, a profissão que permitirá tornar o futuro “um museu de grandes novidades” para cada um deles, e por todos que serão afetados pelo desempenho em suas respectivas profissões. E, é claro, essa escolha não é uma decisão simples. Como tudo na vida, o mercado de trabalho vem se transformando de maneira recorrente. As novas tecnologias, e com elas, as novas demandas de formação profissional que surgem, além da extinção sistemática de antigas profissões, só tornam mais complexo o processo de escolha da carreira a seguir. Some-se a isso, que essa decisão complexa precisa ser tomada por um(a) jovem que sequer completou 18 anos.
Porém, engana-se quem acredita que esse dilema entre novas tecnologias e seus impactos no emprego e no mercado de trabalho é um tema que emergiu recentemente. No século XIX, Karl Marx dizia que as inovações resultavam da necessidade que o capitalismo tinha de encontrar um novo caminho para o crescimento, após períodos de recessão. Marx chamou essa necessidade capitalista de “destruição criativa”. No início do século XX, um jovem economista austríaco, chamado Joseph Schumpeter, acrescentou sua reflexão ao pensamento marxista, afirmando que “novos produtos e novos métodos competem com os velhos..., não nos mesmos termos, mas com uma vantagem decisiva que pode significar a morte dos últimos”. Evidentemente, quando se fala de novos métodos de trabalho e de produção, em muitos casos, a inovação implica em eliminar postos de trabalho.
Em linhas gerais, todos os pesquisadores que se dedicaram aos estudos derivados de Marx e de Schumpeter entendem que as inovações não se traduzem, somente, na eliminação de empregos. Elas podem significar a criação de novas oportunidades de emprego, com outros tipos de qualificação. Este é o caso de Aaron Benanav, professor do Departamento de Desenvolvimento Global, da Universidade de Cornell. No livro “Automação e o futuro do trabalho”, publicado neste ano, o professor Benanav, historiador, sociólogo e teórico social e econômico, escreveu: “o que a última década demonstrou não foi o desaparecimento do trabalho, mas sim sua transformação. Mesmo quando novas tecnologias foram introduzidas, a maioria dos empregos persistiu, ainda que em formas alteradas… o crescimento, a contração ou a estagnação do emprego em um determinado setor depende não somente das capacitações tecnológicas, mas também das condições econômicas mais amplas.”
Por fim, seja pelo que escreveu Marx, Schumpeter ou Benanav, a única certeza que temos sobre o futuro e o trabalho é a de que quem estiver preparado para ambos, poderá apreciá-los, como se fossem um museu de grandes novidades.
Ademar Pereira dos Reis Filho
Doutor pelo IGCE-Unesp de Rio Claro e docente da Fatec Rio Preto