Diário da Região
ARTIGO

Políticas públicas para religiões de matriz africana

Não há um trabalho constante e efetivo contra o racismo religioso nas escolas

por Fabrício Pizelli
Publicado em 25/08/2025 às 19:05Atualizado em 26/08/2025 às 09:53
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De acordo com os dados preliminares do Censo 2022, em São José do Rio Preto, há um aumento de 200% no número de adeptos de religiões de matriz africana, em comparação com os dados do censo de 2010. Longe de se dissertar sobre os inúmeros motivos que envolvem esse fato surpreendente, uma indagação se faz necessária: por que os projetos que envolvem as religiões de matriz africana não ultrapassam a mera promoção de eventos?

Recuso-me acreditar que o povo de axé de Rio Preto está satisfeito em ver que os olhos legislativos da cidade se restrinjam a alguns dias no mês da consciência negra ou uma homenagem esparsa no calendário oficial da cidade.

Além do aumento vertiginoso dos adeptos dessas religiões, é importante salientar que, ao se investigar os dados sobre essas práticas religiosas em nível nacional, constata-se que o católico brasileiro se reivindica enquanto tal, mas que também frequenta um terreiro, vez ou outra, para tomar um passe ou um banho de ervas. Ou seja, ao aplicar esse raciocínio em Rio Preto, o número de pessoas em contato direto e indireto com as religiões de matriz africana é muito maior do que o relatado no Censo 2022.

É indiscutível que a promoção de eventos culturais voltados à valoração dessas práticas religiosas é de suma importância, mas somente isso não basta. Muitos terreiros e roças de umbanda e candomblé estão situados em regiões da cidade com pouca infraestrutura, o que dificulta o acesso e prática dos cultos. O poder público municipal não assegura acessibilidade, luz e água nessas regiões.

Não se propõe, em nível municipal, um trabalho constante e efetivo contra o racismo religioso nas escolas. Tampouco se observa, dos vereadores da cidade, um discurso que reúna as lideranças religiosas da cidade para se pensar uma série de políticas públicas necessárias aos adeptos do axé.

Diante desse cenário, torna-se evidente que o crescimento dessas religiões exige mais do que ações pontuais ou simbólicas. Trata-se de reconhecer o povo de axé como parte constitutiva da identidade cultural e espiritual da cidade, garantindo-lhe não apenas visibilidade, mas também direitos básicos e participação efetiva na vida pública. Somente assim será possível transformar o aumento estatístico em reconhecimento social e político, superando a lógica de eventos isolados e construindo, de fato, uma cidade plural, democrática e justa.

Fabrício Pizelli

Licenciado e Bacharel em Filosofia (Unesp), Mestre em Filosofia (UFSCar) e Doutorando em Filosofia (Unesp). Professor e poeta.