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IPTU: quando o povo dá o tom

Em Rio Preto, o poder do povo moldou o projeto final do IPTU, mesmo que não tenha conseguido eliminá-lo inteiramente

por Henry Atique
Publicado em 26/09/2025 às 22:23Atualizado em 27/09/2025 às 11:51
Henry Atique (Henry Atique)
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A Câmara Municipal aprovou na última quinta-feira projeto que eleva o IPTU para 2026 em até 20%, em sessão marcada por protestos e embates acalorados.

É certo que um tributo ajustado pode ser legítimo em face da inflação ou da defasagem da planta genérica, mas o que ratifica ou quebra sua legitimidade é o estudo, a análise, o debate, o equilíbrio e a transparência no processo decisório.

Já destaquei neste espaço que o parágrafo único, do artigo 1º, da Constituição afirma que “todo o poder emana do povo”. Ou seja: os representantes municipais – prefeito, secretários, vereadores e outros – só têm autoridade porque ela lhes foi atribuída pelo povo e, assim, estão lá para servir, não o contrário, o que precisa ser sempre lembrado.

Isso exige que o povo não se ausente, mas exija voz, respeito e participação. No debate do IPTU de Rio Preto esse princípio foi acionado e funcionou, impondo limites às intenções administrativas. Nas últimas semanas, foram registradas manifestações populares – nas ruas, nas redes sociais, nos gabinetes dos vereadores e no plenário da Câmara – cobrando que o projeto fosse rejeitado ou seriamente revisto.

No fim, o texto com o teto de 20% foi aprovado por 14 votos a 8 dos vereadores. No entanto, vale destacar que a versão inicial enviada pelo Executivo permitia aumentos bem mais expressivos e precisou ser retirada e retrabalhada diante da repercussão negativa. Isso evidencia que o poder do povo moldou o projeto final, mesmo que não tenha conseguido eliminá-lo inteiramente.

A participação popular não é um mero detalhe: é instrumento de equilíbrio que dá legitimidade democrática para as decisões do poder público; define limites práticos, obrigando gestores a calibrar excessos e oferecer ambientes de negociação, impedindo imposições abruptas; previne arbitrariedades; gera responsabilidade política, pois quando políticos veem manifestações fortes sabem que sofrerão cobrança eleitoral por suas decisões, o que opera como freio; e inspira ações futuras, já que o engajamento de hoje molda a cultura cívica, gerando experiência de organização e mobilização que pode servir para outros temas locais.

No caso do IPTU em Rio Preto, a manifestação popular não foi mero ruído: foi parte do debate. Obrigou recuos, revisões, resistiu a propostas mais agressivas e fez do projeto algo negociado, e não apenas imposto.

Os tributos são um mal necessário – os serviços públicos demandam receitas para serem executados – mas não podem ser calculados e aprovados no vácuo social. Se o cidadão abdica de exercer influência, delega poder irrestrito. Se participa, o poder não apenas emana do povo em teoria, mas reverbera pelo povo na prática.

Em Rio Preto vivenciamos isso agora. O aumento de até 20% do IPTU avançou, mas está longe de ser a única pauta importante para o nosso futuro. Cabe a nós, sempre, vigilância e participação ativa nas decisões dos rumos de nossa cidade.

Afinal, o poder que se delega pode ser reassumido em voz coletiva, e quem delega – o povo – precisa estar pronto para fazer ouvir sua vontade. Nesse último embate, ficou claro: quem participa constrói limites, quem se cala se submete a escolhas que podem desconsiderar o interesse coletivo. E, no regime democrático, a melhor garantia de equilíbrio nas decisões públicas é a mobilização permanente do povo.

E, fundamentalmente: temos que sempre acompanhar aqueles que tiveram a confiança do nosso voto – seja no município, no estado ou em âmbito federal – e lembrar das decisões que tomaram ao longo do mandato que a eles atribuímos para decidir se terão nossa confiança novamente nas próximas eleições.

Henry Atique

Advogado, professor, ex-presidente da OAB Rio Preto e conselheiro estadual da OAB/SP