Operação no Rio e os especialistas de redes sociais
A segurança pública não pode se reduzir a manchetes ou vídeos curtos. Mas o debate público está dominado por conclusões precipitadas e pouco tato com a realidade local

No Brasil atual é notório que a segurança pública é a principal preocupação da população. Este contexto faz efervescer, entre outras coisas, o domínio explícito de organizações criminosas por todas as partes – desde as favelas até a Faria Lima e a prodigalidade dos “especialistas de redes sociais” que opinam de tudo, sem realmente saber nada.
Foi nesse ambiente que a operação nos Complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte do Rio, desencadeada no último 28 de outubro, entrou para a história como a mais letal da história do Estado. Mais de 120 pessoas morreram e dezenas de mandados de prisão foram cumpridos. E disso proliferaram opiniões contra e a favor da operação.
A par de manifestar concordância ou discordância, aqui se busca analisar o fenômeno da proliferação dos “especialistas de redes sociais”. Antigamente, havia o “especialista de botequim” – aquele que falava com convicção esmagadora sobre política, economia, direito, saúde, futebol, entre outros, sem qualquer base de verdade. Hoje, esse papel migrou para o Instagram, X, Facebook, WhatsApp, Telegram e outros: todos têm opinião formada, todos têm palanque, mas poucos têm propriedade para o tema que se propõem a manifestar.
A segurança pública não pode se reduzir a manchetes ou vídeos curtos. Mas o debate público está dominado por conclusões precipitadas, verdades absolutas e pouco tato com a realidade local, o que acaba por deixar de lado a complexidade das comunidades, os direitos humanos efetivamente considerados e a real institucionalidade.
Neste ponto, é interessante verificar os resultados de algumas pesquisas recentes de opinião sobre o tema (advertindo que qualquer sondagem carrega margens de erro, formulações próprias e vieses).
Em nível nacional, segundo pesquisa AtlasIntel, a aprovação à operação está em cerca de 55%, contra uma reprovação de 42%. No Estado do Rio de Janeiro, a aprovação se eleva: a pesquisa Genial/Quaest mostra que 64% dos moradores aprovam a operação, contra 27% que a desaprovam. Na capital fluminense e sua região metropolitana, pesquisa Datafolha revelou que 57% dos habitantes consideraram a operação um sucesso contra 39% que manifestaram opinião desfavorável.
O que mais salta aos olhos é que pesquisa AtlasIntel mostra que quase 9 em cada 10 moradores de favelas na cidade do Rio de Janeiro, que são os que mais sofrem com a criminalidade e a ineficiência estatal, apoiam a megaoperação contra o Comando Vermelho. Os dados mostram que 87,6% dos moradores de favelas cariocas aprovam a megaoperação, 12,1% a desaprovam e 0,3% não sabem ou não quiseram responder.
Esses números nos mostram que existe adesão social considerável à ação estatal, especialmente em comunidades historicamente impactadas pela presença de facções, o que revela que moradores que vivem sob controle ou constante ameaça valorizam uma intervenção de Estado, por mais controversa que seja.
O Rio de Janeiro, cidade que deveria simbolizar apenas a beleza, a alegria, o turismo e a visibilidade global, convive com o subterrâneo das barricadas, das linhas de tiro e da “guerrilha urbana”. A operação no Alemão e na Penha evidencia que o Estado precisa intervir, mas também que não basta matar ou prender: é preciso institucionalizar a presença do Estado, garantir direitos, reconstruir serviços e produzir cidadania.
E, neste aspecto, o papel do opinar‐sem‐conhecimento prolifera. Nos feeds os “especialistas” disseminam certezas sobre “bandido morto”, “estado assassino”, entre outros. Mas a segurança pública demanda mais: exige dados, qualificação, estudo, vivência e conhecimento. É necessário “colocar ordem”, mas também garantir que a ordem seja justa, permanente e digna.
Henry Atique
Advogado, professor, ex-presidente da OAB Rio Preto e conselheiro estadual da OAB/SP