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Conheça os meus heterônimos

Assim, os heterônimos são identidades próprias imaginárias e fantasiosas, diferindo dos pseudônimos e mesmo das pessoas reais de seus criadores. Poucos escritores se valeram do recurso

por Durval de Noronha Goyos Jr.
Publicado há 23 horasAtualizado há 11 horas
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Como é sabido, a heteronomia é um recurso literário utilizado para o enriquecimento do enredo e mesmo para dar uma perspectiva mais ampla e variada à narrativa da prosa e do verso. Assim, os heterônimos são identidades próprias imaginárias e fantasiosas, diferindo dos pseudônimos e mesmo das pessoas reais de seus criadores. Poucos escritores se valeram do recurso. O mais famoso deles foi o genial poeta português, Fernando Pessoa, cujos heterônimos foram objeto de um livro específico do professor italiano, Antonio Tabucchi, ‘Un Baule Pieno di Gente’.

Eu também tenho os meus e gostaria de apresentá-los aos meus leitores. Advirto que nenhum deles é confiável. O primeiro é o luso-brasileiro António Paixão, criado em 1971, quando fui editor do jornal acadêmico ‘O Paulista’, da Faculdade de Direito da PUC - SP. Eram tempos sombrios e Paixão personificou um auxiliar contestador. Ele era seminarista, na ocasião. Em seguida, foi expulso do educandário. Posteriormente, tornou-se um escritor publicado, aclamado, perseguido e vilificado em 2 continentes.

O Bardo do Bixiga ou Trovador do Timão, como gosta de ser chamado, é autor de prolífica obra literária representada por 2 romances, e 5 livros de crônicas, de contos e de poesias. Pela obra ‘Annus Horribilis’, Paixão recebeu o galardão do prêmio fictício Ig-Nóbil, em Lisboa. Ele é desempregado por opção própria, adepto do ócio criativo e um atoa macunaímico. Reside numa ‘palacial’ maloca no Bixiga, de onde sai diariamente às 18:00 horas, mais ou menos, para tomar o seu nutritivo vinho da manhã. O Bardo ‘trabalha’ de noite pelos bares da região. “A carente alma do poeta também precisa de alimento e o sustento do vate é o vinho”, afirma.

Corinthiano fundamentalista, “graças a Deus e a São Jorge”, é tido como o Vate da Gaviões da Fiel. Paixão foi um dos fundadores da torcida organizada, “força fundamental do processo civilizatório brasileiro”, pois amigo do Flávio La Selva, seu primeiro presidente. Casou-se contra a sorveteira ítalo-brasileira, Gigi Dell’ Amore. Habitam na mesma residência, mas não se cruzam. Segundo o Trovador, “o matrimônio afortunado é encontrado no apartado”.

Um outro heterônimo é o cantor, pedreiro, poeta e cozinheiro napolitano, Beppe Molisano, exilado no Bixiga após caso tórrido com a dadivosa mulher do chefão da Camorra tornar-se público. Beppe é tido pelo Paixão como “um cantor de infectos lupanares e pestilentos cabarés”. Mais uma identidade literária é o poeta inglês, Tony Malvern, ‘mercenário da pena, exuberante em todos os vícios, mas modesto nas virtudes’. Por último, o professor e escritor chinês, Yuse Fajing, é um adepto do “marxismo de mercado” e profundo conhecedor da poética de Mao Zedong.

DURVAL DE NORONHA GOYOS JR.

Escritor. Ex-presidente da UBE. Da Academia de Letras de Portugal. Diretor do Sindicato de Escritores. Escreve quinzenalmente neste espaço às quartas-feiras