Diário da Região
PAINEL DE IDEIAS

Segurança, direito fundamental

Como se permitiu, ao longo dos anos, que a insegurança se tornasse parte do cotidiano, uma sombra constante sobre a vida de milhões de pessoas?

por Sérgio Clementino
Publicado em 03/11/2025 às 22:03Atualizado em 04/11/2025 às 10:44
Sérgio Clementino (Sérgio Clementino)
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A megaoperação policial no Rio de Janeiro, que já entrou para a história, gerou controvérsias e certezas. Para muitos moradores, que estão sob constante cerco da violência, a operação foi um vislumbre de esperança, um grito por segurança. As pesquisas mostram aprovação maciça da população, especialmente nas comunidades cariocas. Para quem sente na pele a falta de segurança, esse aplauso mostra o anseio por um mundo em que sair de casa não signifique colocar a vida em risco.

A operação também trouxe, não com pequena intensidade, o fenômeno do “especialista de sofá”. Confortavelmente instalado em sua casa, com um celular em mãos, ele se sente apto a opinar sobre questões complexas como segurança pública e criminalidade organizada. Amplamente alimentado pelas redes sociais, onde a informação flui rapidamente e nem sempre com a devida verificação dos fatos, ele é confiante em suas análises. É a comprovação do efeito Dunning-Kruger, um viés cognitivo que leva pessoas com baixa habilidade ou conhecimento em uma área a superestimar suas capacidades. Em outras palavras, quanto menos alguém sabe sobre um tema, mais confiante tende a se sentir em suas opiniões, justamente porque ignora o quanto não sabe. Nessas horas, surgem soluções simplistas para um problema que se arrasta há décadas. Sem contar aqueles que aproveitam a gravidade da questão para destilar ideologias.

O maior efeito da grande operação, porém, foi trazer à baila o tema que há muito vem sendo negligenciado: a segurança pública. As discussões agora invadiram o debate nacional. O Brasil tem, e não é de hoje, estatísticas alarmantes de violência. Como se permitiu, ao longo dos anos, que a insegurança se tornasse parte do cotidiano, uma sombra constante sobre a vida de milhões de pessoas? Como nos acostumamos a deixar de andar pelas ruas, a ter medo constante, a evitar muitos lugares?

Muito perdemos com a falta de segurança. Não é algo que se pode normalizar. As vidas que se foram, os sonhos interrompidos e o medo que permeia a vida cotidiana são consequências de uma estrutura que precisa ser urgentemente reavaliada. Precisamos de um futuro mais seguro, é preciso que a sociedade como um todo se mobilize, que o debate sobre segurança pública esteja presente nas ruas, nas conversas, nas eleições. Afinal, o direito à segurança também está na Declaração dos Direitos Humanos.

Uma operação policial não muda essa realidade. Mas os resultados mostram a necessidade de se discutir o assunto. Ainda há um caminho a ser percorrido. O desafio é imenso, e as soluções não são simples. É preciso ir além das operações pontuais, que podem trazer resultados imediatos, mas não resolvem a raiz do problema. O Brasil precisa de um plano robusto de segurança pública, mudanças legislativas, enfrentamento do assunto com seriedade. Mais inteligência, menos ideologia. Sem isso, continuaremos a nos perder em ciclos de violência e impunidade, enquanto os "especialistas de sofá" seguirão a ditar regras que não compreendem.

SÉRGIO CLEMENTINO

Promotor de Justiça em Rio Preto. Escreve quinzenalmente neste espaço às terças-feiras