Diário da Região
PAINEL DE IDEIAS

Entre o silêncio e o aplauso

A confiança em si mesmo não precisa ser alimentada por aplausos ou críticas. É um exercício diário acreditar que o que se faz tem valor, independentemente da opinião dos outros

por Sérgio Clementino
Publicado em 08/09/2025 às 19:28Atualizado em 09/09/2025 às 10:55
Sérgio Clementino (Sérgio Clementino)
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O que é o talento? Talento não é apenas ter uma habilidade, ou fazer algo bem-feito. O publicitário Washington Olivetto dizia que uma pessoa talentosa “é aquela que raciocina pelo inverso e tem fascínio pelo lado escondido do óbvio”. Mas, o que realmente faz alguém saber que é bom naquilo que faz? A confiança na própria capacidade ou a aprovação alheia?

Sixto Rodriguez nasceu em Detroit, EUA, numa família humilde, filho de pais mexicanos. Sempre acreditou que tinha talento para a música. Gravou dois discos nos anos 70, mas seu trabalho foi ignorado. Sem opção, foi trabalhar como pedreiro, o que fez por anos. Enquanto isso, cópias de seus discos acabaram indo parar na África do Sul. Suas músicas, que falavam sobre as dificuldades das classes mais baixas e pregavam contra as injustiças sociais, caíram nas graças do povo. Canções como “Sugarman” e “I Wonder” viralizaram do outro lado do oceano. Durante décadas ele não soube que sua voz virou um hino para uma geração oprimida em outro continente e que seu álbum se tornou um símbolo de resistência contra o apartheid. Corria por lá, inclusive, uma lenda que ele havia ateado fogo ao próprio corpo durante um show. Por anos os sul-africanos acreditaram que o ídolo havia morrido.

Até que em 1996 um grupo de fãs criou um site sobre o cantor, que acabou sendo visto pela filha de Sixto. A partir daí, ele soube que era uma lenda da música. E os sul-africanos souberam que seu ídolo estava vivo. Sixto fez turnês pela África, Austrália e Holanda, lotando estádios e casas de shows. Sua vida mudou de forma irreversível. Ele foi aplaudido em palcos que nunca imaginou, recebendo reconhecimento por seu talento em um mundo que antes lhe era invisível. Em 2012, o documentário sueco “Procurando Sugar Man”, que conta sua história, foi premiado com o Oscar.

Mesmo diante de toda a glória, a essência de Sixto permaneceu: um homem que nunca deixou que a aprovação alheia definisse seu valor. Ele continuou a acreditar em seu talento, mesmo quando os outros não o faziam. Nos tempos atuais, onde há uma busca desesperada por validação nas redes sociais, onde é preciso o “like” alheio para se sentir com algum valor, essa história mostra que a verdadeira validação vem de dentro. A confiança em si mesmo não precisa ser alimentada por aplausos ou críticas. É um exercício diário acreditar que o que se faz tem valor, independentemente da opinião dos outros. A luta pela aceitação e reconhecimento é uma batalha que todos enfrentamos, seja no palco ou na vida cotidiana.

Por isso, caro leitor, acredite no seu talento, faça o que acha certo e aprove-se, independentemente da aprovação dos outros. A verdadeira força está em ser fiel a si mesmo e em criar um legado que, mesmo que não seja reconhecido de imediato, pode impactar vidas de maneiras que você nunca poderia imaginar. E quem sabe, em um canto do mundo, suas “canções” podem estar esperando para ecoar no coração de alguém.

SÉRGIO CLEMENTINO

Promotor de Justiça em Rio Preto. Escreve quinzenalmente neste espaço às terças-feiras